A PRIMEIRA CONVENÇÃO CIDADÃ

As Organizações da Sociedade Civil (OSC) têm-se afirmado como um pilar essencial à consolidação da paz, da democracia e do Estado de Direito Democrático e um parceiro incontornável na promoção do desenvolvimento sustentável. A sua criação nos inícios da década de 90 e a sua evolução posterior beneficiaram enormemente da abertura política que viria a consubstanciar-se na edificação progressiva de um regime democrático e multipartidário. Desde então, não cessou de se expandir o leque das suas áreas de intervenção. As suas ações têm contribuído para reforçar a cidadania, tendo muitas delas feito da promoção da democracia, da cultura da paz e da cidadania ativa o seu principal credo e o seu principal eixo de atuação.

Porém, se a década de 90 começou por ser marcada pela multiplicação e até proliferação das OSC, os anos subsequentes, com o seu cortejo de ações desestabilizadoras e de violência política, não deixaram de perturbar o trabalho das OSC. A instabilidade política, cujo efeito se refletiu na gestão danosa de recursos e bens públicos, na fragilização da justiça, no fraco investimento na educação e, particularmente, na sobreposição da classe castrense às instituições civis, tornou-se um dos fatores que têm debilitado o impacto da ação das OSC, não permitindo, por exemplo, que elas trabalhem com as instituições do Estado de forma estável e duradoura.

A convergência deste fatores contribuíram igualmente para desacelerar o crescimento económico do país - condição sine qua non de desenvolvimento sustentável -, agravar os problemas sociais e, principalmente, privar os sucessivos governos da capacidade de adoção de políticas sustentáveis para a promoção da democracia e da paz social. Muitas OSC tiveram que pagar um alto preço pelo simples facto de terem ousado manifestar a sua discordância com o status quo e com o rumo que está a tomar o país, como é o caso da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH).

As OSC têm assim encontrado inúmeras dificuldades no desempenho das suas missões, quer por causa deste contexto social adverso, quer por causa das vicissitudes que caraterizam o seu relacionamento com as estruturas do Estado. A estas dificuldades externas, acrescentam-se as dificuldades internas que elas encontram no seu processo de crescimento e de maturação enquanto organização. Não obstante estas dificuldades, as OSC nunca pouparam esforços para enfrentar estas adversidades, para promover e proteger os direitos humanos e a cidadania, bem como para sensibilizar os cidadãos sobre a imperiosa necessidade de abraçar a cultura da paz, da democracia e de convivência pacífica entre povos de diferentes culturas. Devido ao nível de conflitualidade política e social prevalecente no país, a promoção de cultura da paz tem sido uma das mais importantes ações das organizações da sociedade civil nos últimos 20 anos. Estas OSC têm-se desdobrado em várias atividades que têm contribuído para o apaziguamento das tensões comunitárias e mediação de conflitos de natureza política, social e cultural.

Muitas delas incluem como um dos objetivos primários das suas organizações a promoção da cidadania. A execução de ações concretas nesta área em contextos eleitorais, tais como, educação cívica sobre a importância do voto, debates e programas radiofónicos sobre diversos temas da vida nacional, entre outros, são testemunhas disso.

Neste percurso, as OSC lograram muitos frutos, tendo conseguido, por exemplo, vencer muitas batalhas pela afirmação dos direitos dos cidadãos, protegido os seus direitos e aumentadas as suas consciências cívicas, para além de influenciar as políticas públicas em muitas áreas, como por exemplo a do ambiente e da conservação da natureza. Neste sentido, as OSC estão a contribuir na construção dos pilares do desenvolvimento sustentável, apesar das instabilidades políticas e do próprio desamparo da conservação da natureza pelo Estado.

Vários desafios continuam pela frente, rumo à construção de uma sociedade mais justa, de paz, de respeito pela dignidade da pessoa humana, enfim de igualdade de oportunidades e de desenvolvimento para todos.

Por outro lado, a paz que parece ter regressado ao país desde os finais da guerra fratricida de 7 de junho de 1999, continua a manifesta muitas fragilidades. A Guiné-Bissau vive uma situação de uma democracia ainda frágil e que precisa de ser consolidada, em que os direitos humanos ainda são flagrantemente violados, em que a justiça social é uma miragem. A paz e a democracia continuam por isso a constituir um dos grandes desafios da Guiné-Bissau. Construir o desenvolvimento sustentável passa necessariamente por garantir estes requisitos, sem os quais se torna utópico falar-se de desenvolvimento, um processo que envolve alterações e modificações profundas das instituições políticas, económicas, sociais e culturais.

No ano em que se comemora o centenário de nascimento de Amílcar Cabral (1924-2024) e por ter sido aquele que soube sonhar o desenvolvimento da Guiné-Bissau, importa lembrar, nas suas palavras, que o objetivo da independência consistia em “lutar para o progresso da nossa terra, temos que fazer todos os sacrifícios para conseguirmos o progresso da nossa terra…temos que acabar com todas as injustiças, todas as misérias, todos os sofrimentos. Temos de garantir às crianças que nascem na nossa terra, hoje e amanhã, a certeza de que nenhum muro, nenhuma parede será posta diante delas. Elas têm que ir para a frente, conforme a sua capacidade, para darem o máximo, para fazerem o nosso povo e a nossa terra cada vez melhores, servindo não só os nossos interesses mas também os interesses da África, os interesses da humanidade inteira”.

Mais uma vez, as OSC são chamadas a intervir, desta vez não como aquele ator que está a dar os primeiros passos para conquistar um lugar na sociedade em construção, mas como um coletivo de atores portadores de uma experiência e de um enorme capital de resiliência forjados no labor quotidiano pela sua emancipação e pela emancipação da sociedade e dos seus cidadãos.

Imbuídos desta inestimável experiência e “saber fazer”, as OSC decidiram promover a Primeira Convenção Cidadã (CC), contribuindo desta forma para potenciar a “agency” daqueles que devem beneficiar do desenvolvimento sustentável, e para que o mesmo não tenha de ser “trazido” de fora, mas que resulte de uma dinâmica interna suportada pelos próprios beneficiários à medida em que se vão apropriando do seu próprio destino.

Ela será um grande fórum da sociedade civil e das Organizações da Sociedade Civil (OSC) em particular, onde serão debatidos todos os aspetos que dizem respeito à sua vida enquanto estruturas autónomas que aspiram ao desenvolvimento socioeconómico da Guiné-Bissau. É uma atividade de reforço das OSC para facilitar que, no futuro, possam estabelecer um diálogo estruturado com o Governo e influenciar as políticas públicas.

Nesta perspetiva, a CC é igualmente um fórum onde se fará a apresentação dos resultados e se promoverá a discussão com estas estruturas durante cinco dias de palestras temáticas. Nestas palestras serão discutidas as recomendações propostas por cada temática e definida a lista de recomendações que serão monitorizadas durante o ano de 2024. Num dia suplementar será feita uma apresentação pública oficial onde se realizará uma restituição das recomendações ao Governo. Seguidamente, far-se-á a monitorização através de vários observatórios numa plataforma on-line. Espera-se que este dispositivo venha a contribuir para criar mecanismos de discussão, coordenação e melhoria da comunicação entre as OSC e os cidadãos em geral. É vontade de todos os atores nela envolvidos que ela se transforme igualmente num evento periódico de reflexão e diálogo entre os cidadãos e os representantes políticos. A criação e manutenção de uma plataforma on-line servirá para que as OSC e os cidadãos em geral acompanhem os trabalhos realizados sobre as dez (10) temáticas e que sirva de mecanismo de coordenação e comunicação entre eles.

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